Já se estendem atrás de nós mais de um século desde que as impressões de luz eram prosaicamente chamadas de fotogramas, hoje são meramente fotos.
A cada esquina entretanto a luz se solidifica em fotogramas que marcam a memória e passam a vagar pela nossa mente inconsciente. O senhor de baixa estatura, para lá dos 70 anos, mas dono de poderoso bigode negro e vastos cabelos também da cor do véu da noite, a face repleta de rugas que testemunham os anos e histórias que se armazenam naquela figura destoante. As roupas em memória dos tempos que já passaram, o sapato de couro fino, a calça preta social de tecido leve e a camisa de mangas compridas emoldurada por suspensórios vermelhos de presilhas douradas.
Uma imagem fugaz, como os oito segundos durante os quais persistiu diante dos meus olhos. E quanto à infinidade de fios de vida que encontram naquela figura a sua interseção? E os tantos outros fios que partem daqueles olhos profundos, seus descendentes, amigos…
Neste blog sempre olhei para o coletivo, fiz as fotos dos grupos que cruzam nossas vastas e muitas vezes áridas avenidas, e o calor do indivíduo? Aquele que chega em casa com sua solidão, retira o sapato dos pés surrados depois de um dia de trabalho em sua banca de jornal (caso da nossa figura) e sente por um breve momento a falta dos que já foram ou que já não se importam com eles, pais, esposas, filhos… para logo depois ligar a televisão ou juntar-se aos amigos para um jogo de damas que afaste as saudades e ajude a suportar o tempo enquanto o tempo não se esgota…