Primeiro aviso: eu sei que a imagem é do filme! Vou falar dele no final do post, ok?

Segundo aviso: não faço spoiler, pode ler se medo. Se eu perceber que preciso fazer algum vou colocar depois de tudo e bem avisado.

Crítica do livro

A Coisa me impressionou muito.

Li O Iluminado há uns 20 anos e só lembro de ser um bom livro de Terror. IT é bem mais que isso.

Tenho resumido dizendo que pode-se facilmente tirar o monstro da história e ainda será um excelente livro que nos conduz através de boa parte do século XX abordando desde a homofobia e o racismo até a violência contra mulheres e crianças.

é um espectro muito vasto para comentar em detalhes aqui e sem fazer spoiler, mas já me permite uma primeira sugestão: quem quer um livro de suspense e terror para se desconectar da realidade pode não gostar de A Coisa.

Minha sugestão de leitura seria “preste atenção nas pessoas”. Cada personagem é rico e nos leva a entrar em contato com coisas muito reais para nós mesmos ou para pessoas próximas de nós.

Um efeito curioso disso é que as partes mais assustadoras são muito reais e não envolvem A Coisa. São situações que podem e devem estar acontecendo agora mesmo enquanto você lê esse texto e estarão acontecendo enquanto você estiver lendo o livro.

Stephen King consegue nos guiar pela história intercalando a presença crescente da Coisa com as histórias que giram em torno dos sete protagonistas de uma forma que não há momentos de monotonia pois cada uma das histórias paralelas é empolgante ou impressionante à sua maneira.

Uma amiga acaba de dar a versão de papel para a afilhada que tem quinze anos e diz que não tem medo de terror.

Eu não daria IT a qualquer jovem de quinze anos.

Logo no começo você percebe que o livro oscila entre a infância e a idade adulta dos protagonistas e, tanto os acontecimentos na infância deles quanto os na idade adulta são apresentados sem subestimar o leitor.

Se você quer proteger a criança do mal que existe no mundo então IT pode não ser para ela.

É claro que conhecer o mal nas páginas de um livro é muito melhor do que enfrentá-lo pela primeira vez em sua própria vida e eu gostaria de indicar o livro para todas as crianças acima dos 12 anos, mas cada família deve saber qual é o seu “timing”. Só acho difícil uma criança com menos de 12 anos saber encarar numa boa o que IT tem para mostrar.

Se você pretende comprar o livro para um adolescente a minha sugestão é que você folheie pelo menos os trechos com a Beverly adulta. Fica fácil se você estiver com a edição digital.

Existe uma cena que eu acho muito ousada, mas gosto, e gostaria de comentar com as pessoas, mas é um spoiler enorme! Com sorte alguém saberá que cena é e colocará nos comentários, então, se você não quer spoilers não leia os comentários.

A Tradução

Minha esposa e boa parte dos meus amigos são tradutores então isso é algo que me chama muita atenção.

Temos um mercado de tradução brilhante no Brasil. Não são poucos os livros que considero melhores na versão nacional que na original.

Eu já conhecia tanto o trabalho da Regiane Winarski quanto a própria Regiane (que é uma amiga querida) e decidi que esse era o momento de ver por que tantos amigos gostam tanto de Stephen King.

A tradução anterior foi feita na década de oitenta do século passado e, além de algumas partes terem sido “amaciadas” (talvez por solicitação da própria editora e não do tradutor) ela tinha um ritmo mais característico da década de 70 que tornava a leitura menos fluida e, me parece, menos coerente com o estilo do Stephen King.

É claro que a edição de um livro não termina na tradução: os editores podem melhorar ou até estragar o trabalho do tradutor. Portanto estão todos de parabéns.

O Filme

Depois de ler o livro tive que rever o filme e… Bem… Creio que a maioria dos leitores vão concordar comigo: o filme é ruim.

Veja bem, não culpo o roteirista, o diretor, o montador ou mais ninguém: não consigo imaginar como fazer um bom filme à partir de A Coisa, então não posso esculhambar os outros.

No entanto algumas coisas importantes se perderam.

IT é sobre a apatia humana diante da crueldade, sobre a invisibilidade das crianças, sobre a capacidade de manter a mente aberta para as possibilidades e, acima de tudo, é sobre responsabilidade e fidelidade aos amigos.

Isso tudo ficou pouco tangível no filme que acaba sendo uma correria entre aparições da Coisa.

E ainda assim as cenas em que ela aparece foram bem resumidas. Bem… São mil páginas para transportar para a tela…

A Coisa é um ótimo instrumento para quem quer mostrar as vantagens da leitura para um jovem pois o filme sempre será uma sombra pálida da obra. Creio que isso deve se repetir em muitos livros do Stephen King.

Ainda assim os fãs de terror podem gostar do filme… Apesar do que eu acho que merecia ser produzido novamente aproveitando que filmes de nove horas divididos em três partes agora são moda.