Depois de conversar com muita gente no FB decidi que tinha que escrever sobre o respeito aos sentimentos da gente e de outros animais.

Recapitulando para quem esbarrar nesse post alguns anos depois: Essa semana um grupo de pessoas de várias organizações que pretendem defender animais invadiu o laboratório Royal e retirou de lá quase 200 beagles e mais um número de coelhos que eram usados para testes farmacêuticos. Até onde pude apurar eles não fizeram vídeos com as condições do lugar antes deles entrarem, não fizeram vídeos da ação deles e destruíram computadores e documentos que poderiam ser usados para averiguar se ali havia ou não crueldade com animais. Quase todas as fotos que eles divulgaram mostram animais que parecem saudáveis e bem tratados.

É claro que a maioria das pessoas está festejando a libertação dos beagles (e uns poucos falam dos coelhos), afinal cachorrinhos fofinhos nos emocionam, eu mesmo chorei ao ver o vídeo das pessoas saindo por baixo de uma cerca com vários bichinhos e achei que tinham sido achados abandonados.

Mas se nós amamos mesmo os animais temos que colocar o bem estar deles acima das nossas emoções e pensar se o que aconteceu deve ser festejado, se devemos apoiar a repetição disso.

Se essa questão realmente nos sensibiliza devemos também entender as pesquisas pré-clínicas, clínicas e como e por que são feitas. Quando são feitos testes em animais? Qual é o percentual de animais abatidos para desenvolver novas cores de cosméticos? Qual é a participação da pesquisa de remédios na quantidade de testes em animais? Os testes podem ser feitos somente em animais humanos? Os animais usados por laboratórios são maltratados? Em que situações eles sofrem?

Outro ramo de questionamentos é em torno de como lidar com os casos genuínos de laboratórios que tratam seus animais com crueldade: como documentar o que acontece lá? Como planejar um resgate digno para os animais? Como registrar as condições em que viviam e obter provas? Pois tudo isso parece ter sido ignorado pelo grupo que invadiu o Royal.

A emoção que sentimos ao imaginar que bichinhos podem estar sofrendo prejudica nossa capacidade de analisar adequadamente o que acontece e, portanto, encontrar soluções, mas volto a perguntar: os animais não merecem que a gente controle nossas emoções em prol deles?

Na onda de ira que assisti vi pessoas clamando pelo fim dos testes em animais e desejando que os testes fossem usados como forma de tortura contra humanos (criminosos, pessoas que usam os produtos).

Eu até concordo que a gente produz cosméticos demais e devemos tentar conscientizar nossos amigos para que não comprem produtos novos e somente os antigos que já foram testados em animais e em pessoas (sim, todo produto é testado em animal e em pessoas em algum momento).

No entanto não podemos deixar de buscar remédios novos.

Como eu disse, a emoção de saber que bichinhos fofos são cobaias atrapalha nosso raciocínio, mas e as criançinhas que precisam de remédios? E as pessoas que sofrem de dolorosas e degradantes doenças? Por que elas mereceriam sofrer? ou até mesmo… Quando estivermos com uma fortíssima dor de cabeça vamos nos recusar a usar outro remédio além de chás ou acupuntura?

No final do post vou colocar alguns links que mostram que não existem formas alternativas para saber se um produto é seguro para o consumo humano. Na verdade acho que todos nós que nos importamos com os animais devemos pesquisar e ver que alternativas são essas que costumam citar e ver se elas fazem sentido, vou facilitar: testes em células e simulação em computador…

Bem…

Pense um pouco. Será que se o produto não fizer mal a um grupo de células ele não fará mal ao chegar a outras partes do corpo humano? Você daria para uma criança um remédio que ninguém sabe como vai interagir com o resto do corpo das pessoas? Pesquise por Geração Talidomida e você verá o que uma pesquisa científica mal feita pode produzir (na década de 50 a ciência era menos metódica e não foram feitos todos os testes pré-clínicos e nem os clínicos).

Quanto a simulações em computador é ainda mais fácil mostrar: assista um desses caríssimos filmes de Hollywood com atores virtuais. A gente não consegue simular nem a aparência da pele ou dos olhos humanos com perfeição, o que dirá o comportamento funcional de cada órgão nosso. Somente para simular um coração humano batendo há pouco tempo eram necessárias 30 horas de cálculos em um supercomputador.

Eu sei, eu sei, é como alguns amigos meus muito cultos e inteligentes disseram “Não quero saber nada disso, eu não consigo imaginar que tem bichinho sofrendo!!”

Cara, é difícil para todo mundo, mas vou dizer de novo: se a gente quer mesmo que isso se reduza temos que saber controlar essas emoções para ver o mais próximo possível da realidade, afinal temos ainda a indústria das fazendas corporativas que mantém bilhões de animais em condições aterradoras antes de abatê-los, mas nem vou falar neles agora.

Esse vídeo ajuda a ver como é mesmo a pesquisa científica com animais: Saiu do ar

Mas resumindo:

  • Existe um grande esforço da comunidade científica na redução dos testes com animais tanto por motivos éticos, quanto práticos (é mais caro) e hoje menos de 1% dos testes são feitos em cães, gatos ou outros primatas
  • Os animais precisam ter uma vida tranquila para que os testes funcionem
  • Os pesquisadores não são monstros cheios de tentáculos que tem prazer em ver os outros sofrerem
  • Existem casos de vivissecção em escolas e universidades sem controle adequado
  • Existem laboratórios ilegais de pesquisa
  • A indústria de cosméticos é um ponto onde podemos reduzir muito a quantidade de testes diminuindo a sanha por novos produtos

Mas veja o vídeo e baixe os documentos que estão na descrição do vídeo.

Sobre essa recente invasão ao Instituto Royal creio que já deixei claro o que penso no segundo parágrafo, mas vou repetir: foi tudo errado. Não houve respeito pelos sentimentos dos cachorrinhos na hora que os tiraram do seu ambiente, não documentaram possíveis provas de abusos no local, os bichinhos estão com veterinários que não conhecem a história clínica deles e não poderão tratá-los adequadamente, as pesquisas foram destruídas o que pode prejudicar pessoas que precisam dos remédios que estavam sendo estudados, como não se poderá provar que havia abusos o instituto terá que refazer a pesquisa levando novas gerações de beagles a serem testadas e jogando fora o sofrimento que os resgatados porventura tenham sofrido. Tudo errado. Tudo causando dor e sofrimento a animais e humanos. Isso sem falar no risco de levar para a população humana e animal o risco de uma epidemia caso algum dos animais esteja contaminado com alguma doença que fosse alvo das pesquisas.

Todos queremos menos testes com animais, no entanto atitudes irresponsáveis como essa não podem ser estimuladas! Nossa ação deve ser no sentido de documentar, denunciar, informar a nós mesmos e aos amigos sobre pesquisa científica em papos e em artigos como esse.

Esse vídeo do Pirula está muito instrutivo e é especificamente sobre o caso. Tem algumas informações importantes no final para quem quer realmente defender animais.

O Resgate dos beagles Pirula 65.1

Algumas observações tiradas dos comentários de uma das cientistas veterinárias mais brilhantes que eu conheço:

…os beagles são os últimos de uma complexa escala de testes laboratoriais. E antes são incluídos outros animais, não tão fofinhos, como ratos / cobaias e outros. Pq a gente não escuta desse pessoal que faz proteção falando de pequenos roedores? Pq ninguém se manifesta contra os primatas não humanos usados em pesquisas para vacina contra malária? São animais! Mas são grandes e muitas vezes agressivos. Apelo social zero! No entanto, o papel deles na saúde humana mundial é gigante.

Sem falar nos cavalos do Instituto Vital Brasil que são mordidos por cobras para se produzir soro anti ofídico. Papel imensurável. Quantas vidas humanas foram salvas?

Esses animais são criados em laboratório para esse propósito. E muitas vezes são o que chamamos de SPF (specific pathogen free), ou seja, tem o sistema imune zerado. Uma explicação para um leigo, sem termos técnicos, significa que saírem de um ambiente ALTAMENTE controlado, pode ser tão prejudicial quanto um pacientes com AIDS não tratado ter contato com uma pessoa simplesmente resfriada.

Atualizando em 23/10/13
Como notei que muita, mas muita gente mesmo não tem informação sobre testes em animais vinha me focando em mostrar que eles são inevitáveis em nosso atual estágio científico.

Se, por ignorância, achamos que testes são feitos por pura crueldade dos pesquisadores então nem adianta querer ir além, mas me sugeriram que a gente devia estar discutindo as questões éticas.

Bem… Eu acho que a dificuldade em se deparar com o dilema ético é justamente o que leva muita gente a preferir a ignorância a ter que lidar com a questão ética. Ontem mesmo conversei com uma amiga que é uma ótima pessoa e, depois que mostrei a ela que os testes em geral são inevitáveis, me disse “fiquei tão emocionada vendo os beagles que nem quis pensar em mais nada”. É… Mas pelo bem dos animais a gente precisa enfrentar nossos dilemas éticos. Lá vai.

Ética [2.1] – Resposta aos dilemas éticos (#Pirula 18)

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