Não se pode dar um passo sem esbarrar em alguém, os rostos e as roupas simples, os olhos cheios de tanta expectativa que se enchem de lágrimas. Lá longe há um palco e homens que fazem os últimos ajustes. Tão longe que, esticando a mão à frente do rosto eles se escondem atrás de apenas um dos meus dedos.
– Ah! Se der dez horas e ele não entrar eu vou embora!
São oito horas e quarenta minutos desta noite de lua quase cheia e distantes relâmpagos, o tom suave da frase acima traduz o carinho deste povo simples pela figura que logo entrará de branco (como sempre) para o primeiro show gratuito em muitos anos. Roberto Carlos no Aterro do Flamengo…
Nas lentes grande-angulares da mídia o arrastão que ocorreu ao meu lado, e nem percebi, teve proporções para apavorar milhares, aparentemente a paciência e carinho que reinou escapam à lente suja da mídia.
Há um pedaço deste povo que olha aquela multidão e vê rostos simples, gente simplória com jeito de suburbano. Sob o encanto escuso, obscuro, da tela quadrada (ou wide screen) da mídia que vem pelo ar os traços humildes do nosso povo degeneram em estereótipos jocosos. É um povo forte, puro, sensível, que fala cantando e que esbanja criatividade, um povo que de tanto se olhar no espelho distorcido da tv enxerga um rosto torto ao olhar no espelho.
Hoje vi o povo sem lentes…