Me preocupa um pouco quando vejo gente defendendo a leitura, mas sem entender de que a defendem.

Esse texto (A Redação da Ufrgs) a defende da Internet e, nas últimas décadas já vi outros defendendo do cinema, da TV, do videogame, dos esportes e até dos quadrinhos. Se fosse um pouco mais velho teria lido algo defendendo-os do rádio.

O fenômeno é antigo. Eu passei boa parte da infância em colégio de riquinho e quase ninguém lia, vários liam só as orelhas e vinham pedir as sinopses para os nerds que liam tudo. E lá se vão mais de 30 anos.

Até os 16 anos li perto de 500 livros, sempre amei ler pois era uma forma de fugir de uma realidade que não me agradava (depois tomei gosto mesmo e sei que tem gente que aprende a ler por razões mais agradáveis), mas achava um saco os livros que o colégio indicava que eram clássicos distantes demais do meu tempo (e creio que a maioria das crianças está muito interessada no presente) ou simplesmente chatos, desconfio que evitavam os livros que tratassem de temas delicados para a época.

Se continua assim talvez a escola contribua bastante para o desgosto com a leitura…

Outro inimigo dos livros é o culto à superficialidade que já caminha para seu centenário. Quem lê é nerd e nerd é chato, legal é quem tem roupinha da moda, canetinha importada ou músculos para exibir. Isso na versão da minha adolescência, mas vejo que isso não mudou muito apesar de ser chique ter smartphone ou tablet e já é uma boa coisa quando janelas para outras pessoas e informação estão no centro do consumismo.

O consumismo (favor não confundir o que vem a seguir com fanatismo anti-capitalista) aliás é outro inimigo dos livros pois, se a medida do nosso valor está nas coisas que carregamos e não nas histórias que vivemos então é desperdício de tempo passar 8 ou 12 horas conhecendo uma história que podemos ver em 2h no cinema.

O papel… lamento muito aos fetichistas do papel, mas ele é outro obstáculo no caminho dos livros. Ele os encarece, quase impossibilita a realização de livros que não se espera que venderão bem e são menos atrativos para novas gerações que preferem acesso imediato e formas digitais para as coisas. Eu mesmo conheço algumas pessoas que nunca foram de ler e se apaixonaram pelos livros depois de conhecer o papel digital.

Um inimigo antigo que tem recuado é o preconceito com o tipo de literatura que atrai as crianças como fantasia e ficção científica, mas ainda vejo muitos amantes de livro torcendo o nariz para os Harry Potter e Jogos Vorazes da vida. Aliás a literatura de consumo para mulheres (Marian Keys e até os vampiros fadinha) também é ridicularizada por muita gente. Eu mesmo critico bastante algumas delas, mas em termos de estimular o hábito da leitura são muito melhores que Proust. Se algum adolescentes quiser de presente, se eu achar que ele vai gostar de um desses, pode ter certeza que darei de presente.

No entanto acho que o maior inimigo do livro está em um período das nossas vidas que não tem videogame, TV, cinema e muito menos Internet, está na infância quando escolhemos nossos instrumentos para lidar com a vida.

Ganhei meu primeiro livro quando tinha um ano. Era de pano para que eu não o rasgasse. Até hoje lembro do barulho dele quando eu puxava repentinamente as páginas coloridas.

Quando a criança cresce com livros ela aprende a ler com a naturalidade com que pensa, ela transforma as palavras diretamente em imagens e sensações, ela lê em 6D

Desenvolver isso mais velho vai ficando cada vez mais difícil.

Quando foi a última vez que você deu um livro para uma criança? Quando foi a última vez que você viu darem um livro para uma criança? Mas, olha, não é o livro que sua moral determina, é o livro que ela vai aprender a amar

Imagem: HouaVang