Tive preconceito com a série.

Ah! Antes de mais nada, não tem spoilers. Siga em frente sem medos.

Quando vi no trailer as imagens carregadas nas cores como se a série inteira fosse uma foto de Instagram do tipo “Vida maravilhosa no eterno verão das ilhas Fiji” e ainda embalada por Bossa Nova e todo aquele espírito hedonista e escapista da era dourada eu tive preconceito.

A série no entanto é uma gratíssima surpresa.

A palete de cores realmente nos remete imediatamente ao mundo da década de 60 como é idealizado hoje, uma época de leveza e alegria, um tempo ao qual gostaríamos de voltar e essa é aliás uma síndrome comum, a do saudosismo com um passado que nunca existiu, que idealizamos porque éramos crianças protegidas da realidade ou jovens alienados que continuaram alienados.

Então vem a grande surpresa: a história entra em contraste com as cores e nos apresenta aquilo que não vimos quando éramos crianças ou jovens… Bem, ou que nossos pais e avós não nos contam, não sei se você viveu os anos 60 (eu mesmo só vivi à partir dos 70).

Não é só isso, a história é quase contemporânea praticamente uma máquina do tempo como se nos levasse com a nossa consciência moderna para aquele tempo. Isso pode até gerar algumas críticas de que a história é inverossímil, mas me parece que verossimilhança não era a ideia e sim desconstruir a visão errada que temos do passado e esse é um mérito preciosíssimo, tão precioso que vou repetir:

Coisa Mais Linda desmitifica os anos dourados mostrando que a crueldade e desvios da sociedade atual já estavam lá, apenas abafados pela naturalização daquele comportamento.

Ainda esses dias lembro que, acho que até o final da década de 70, homens saiam inocentados depois de assassinar suas mulheres por terem matado por amor. Era o crime passional lembro dos adultos divididos, descobrindo aos poucos que aquela história era absurda. Até então não era, até então era natural.

Estão representadas na série questões de gênero, conceito de família, empoderamento, privilégios e, vou destacar, as diferentes escalas de privilégios e preconceitos de cor, sexo e grupo econômico a pertencemos lançando a questão de que frequentemente nos dividimos entre as pessoas muito fodidas e as pouco fodidas quando deveríamos nos unir uma vez que, umas menos e outras mais, todas estamos fodidas em algum nível

Por um certo ponto de vista quase toda a sociedade está unida pela pressão social limitando sua natureza e suas possibilidades.

Por último deixo mais um elogio à série por construir vilões que se integram ao contexto social, que tem camadas e que poderiam ser pessoas normais em uma sociedade mais saudável… Bem, não que a gente fique com menos raiva deles ou que eles mereçam mais compaixão por isso, afinal precisamos da catarse para aliviar a frustração com as injustiças vividas por pessoas que simplesmente seguem seus potenciais e talentos.

Precisamos dessa desconstrução dos vilões, entender que não são monstros inevitáveis, que uma sociedade saudável identifica essas pessoas e as conduz por caminhos em que não são nocivas para a coletividade em vez de lhes abrir as portas para posições de poder na economia, na política, na mídia.