Quando vi o filme há muitos anos achei que o livro devia ser legalzinho.
Agora que li o primeiro livro posso dizer que o filme não faz jus ao livro.
Ah! Pode ler sem medo de spoiler pois não gosto de revelar nada da trama do livro e estragar a graça de descobrir lendo.
Esse é um desses casos em que o filme deve ser visto como outra obra.
Enquanto o filme provavelmente foi feito para quem tem menos de dez anos o livro com certeza busca um leitor uns poucos anos à frente, meninos e meninas.
A forma como o mundo de fantasia vai sendo revelado no livro é muito mais realista do que a do filme e por realista eu não quero dizer que poderia acontecer em nosso mundo real, claro que não, é um livro de fantasia, né?
Por realista eu quero dizer que é uma forma menos infantil de mostrar a magia do Mundo de Tinta.
Além disso as pessoas no filme são quase bobas enquanto no livro são bem mais sérias. Elas estão realmente sofrendo e quando são más são realmente más.
Não chega a ser um livro adolescente como os mais recentes onde não falta sangue e violência. Cornelia Funke tem um jeito suave de tratar seu leitor e nos introduz a sofrimentos e maldades bem reais com o cuidado de não nos desesperar com um mundo até mais cruel que o nosso mundo real.
Uma das coisas que mais gostei no livro é essa homenagem que ele faz aos próprios livros, ao ofício de escrever e a habilidade de saber ler uma boa história.
Ela, Cornelia, também nos fala sobre a solidão que afasta algumas pessoas das outras, uma solidão que nós mesmos escolhemos simplesmente por não querer aceitar o mundo como ele é e preferirmos um que seja sonhado por nós ao navegar por livros bons como o próprio Coração de Tinta.
Mesmo o livro não sendo infantil considero uma ótima leitura para jovens com oito anos ou até menos, nem que os pais leiam para eles. Aliás é o livro perfeito para ler para os outros, mesmo não sendo um livro curto. Quem sabe ler meia hora dele por dia e deixar a criança ler sozinha depois para encontrar suas próprias vozes interiores?
Muitas vezes os livros modernos são escritos com tanta preocupação em fazer sucesso que ficam com almas superficiais, como borboletas que nascem às pressas e não vivem muito tempo.
Seria um absurdo que um livro sobre a paixão por ler e escrever fosse assim e realmente esse primeiro livro da série nos oferece uma viagem por uma história que parece ter sido escrita com prazer e respeito pela autora.
A tradução é boa ainda que me incomode um pouco por ter uma pegada mais antiga e formal como “Todo o medo desaparecera”. Prefiro mais informal em um livro como esse, mas isso é uma questão de estilo: é uma tradução mais para formal e talvez o original seja mais para formal também (nem folheei o original)
Tenho que falar outra coisa do filme porque provavelmente muita gente que gosta desse tipo de livro pode ter visto o filme antes.
O filme muda coisas do livro que alteram o próprio sentido e caráter da história e de alguns personagens. É o tipo de mudança que eu acho indesejável e gostaria que declarassem claramente no começo: “Esse filme é uma adaptação livre de…”
Conforme for lendo os outros dois vou escrevendo artigos para eles também e colando o link aqui, certo?