Que história, gente!!!
Pode seguir sem medo de spoilers, vou falar do impacto que ele causa na gente e não dos acontecimentos.
Para você decidir se é o tipo de livro que você gostaria de ler: É uma história sombria e claustrofóbica sobre o vazio que sociedades estruturalmente machistas podem causar às mulheres. A protagonista Yeonghye decide se tornar vegetariana, mas seus motivos e sua jornada são quase que exclusivamente narrados primeiro por seu marido, depois por seu cunhado e finalmente por sua irmã.
Descrito assim, e acostumados com as discussões sobre veganismo ou vegetarianismo podemos ter uma impressão errada da história. Yeonghye poderia ter decidido qualquer outra coisa que a tirasse do padrão aceito pela sociedade sul coreana, que parece ser mais machista e tradicional que a nossa, mas ainda assim bem similar.
Ah! Alguns pontos técnicos.
- Editora: Todavia
- Tradução: Jae Hyung Woo (gostei bastante)
- Ano: 2007 / edição de 2012
- Páginas: 176
- Controvérsias: A tradução americana de A Vegetariana foi muito criticada, e realmente as diferenças são grandes, mas felizmente a tradução brasileira foi feita diretamente do coreano e parece refletir bem melhor as intenções da autora.
A Vegetariana é uma obra para retratar, não para propor soluções ou sugerir possibilidades utópicas, isso fica por nossa conta ao ler, refletir sobre a sociedade, identificar se existem paralelos com a nossa e despertarmos para a necessidade de mudarmos alguma coisa.
É importante saber que ela pode ativar muitos gatilhos apesar de não ter muitas cenas graficamente chocantes, talvez apenas uma, mas é psicologicamente tenso.
O perfil e comportamento de Yeonghye tem uma atmosfera de irrealidade, como se ela não fizesse totalmente parte desse mundo. Ela me lembrou a personagem Fukaeri de 1Q84, que se expressa sem deixar transparecer seus sentimentos, como se não os tivesse, mas Yeonghye tem uma intensidade voraz em seu silêncio e modos contidos.
Talvez aconteça com você também, mas imagino que seja diferente para cada pessoa que lê: me identifiquei com ela ainda que eu seja homem, pertença a outra cultura e sequer experimente o mundo da mesma forma que ela, mas existe uma sinceridade e pureza nela que chegam a ser sobrenatural ainda que a obra trate mesmo é das nossas mentes no limite.
O parágrafo abaixo pode ser spoiler, então vou deixar letra branca com fundo branco.
No entanto, e esse pode ser um dos gatilhos mais intensos da história, no limite às vezes encontramos a paz. Quando desistimos da humanidade ficamos livres para voltar à fonte da vida ou o que vemos como a fonte da vida ou talvez como uma única via de escape de uma humanidade pesada e desconectada da pureza orgânica da Terra.
Vejo em A Vegetariana Três grupos de pessoas: Yeonghye representa quem não tem amarras ou decide se libertar totalmente, o que pode ser perigoso; sua irmã que procura se manter refratária para resistir em uma cultura que nos sufoca e os homens, o marido de Yeonghye e o da sua irmã que, ainda que muito diferentes, acabam tendo perfis éticos e morais muito semelhantes.
Isso não abrange muitos tipos de pessoas de uma sociedade e talvez por isso seja uma história meio claustrofóbica.
Apesar de tudo tem momentos de suavidade e pureza que são belos até que os vemos em mais dimensões e começamos a perceber que os tentáculos que se entrelaçam na sociedade criando e perpetuando estereótipos acabam se infiltrando em tudo.
Com isso não quero dizer que a sociedade é irremediavelmente doente, nem mesmo que ela é doente. Ficamos com essa impressão por estarmos presas naqueles três tipos de pessoas.
O que A Vegetariana pode estar nos mostrando, e intensificando para ficar claro, é que nossa sociedade não está saudável, que temos nódulos que devem ser conhecidos e tratados para que a humanidade possa ser cada vez mais humana.
Usei uma árvore para ilustrar o post porque elas tem um papel simbólico a certa altura da história. Você verá ao ler o livro!
Photo by Adarsh Kummur on Unsplash