Não pretendia escrever hoje, muito trabalho e pouco tempo, sabe? Mas ai recebi um email pedindo para assinar uma petição online contra o artista que fez de um cão moribundo, alegadamente, uma obra de arte.

O cão foi amarrado na galeria em um dia e morreu durante o dia seguinte. 

Assim como milhares, ou mesmo milhões de cães de rua, ele já estava doente e abandonado pelas ruas quando foi capturado pelo artista.

Nossa primeira reação é de horror, para ser sincero a segunda também… Afinal, filho único, minha irmã era uma cocker spaniel. Acontece que tenho o costume de pensar nas coisas não apenas no impulso das emoções, mas também à luz do pensamento crítico livre das influências do coração.

Será que as 50 mil pessoas que votaram na petição online são vegetarianas? Será que ignoram os horrores infinitamente superiores a que são submetidos suínos, aves e bovinos para satisfazer nossa sanha alimentar?

A arte tem a difícil tarefa (e praticamente só ela) de dissecar os nossos horrores diante dos nossos olhos! A arte de entretenimento existe, mas é ótima para tempos dourados (se bem que esses são frequentemente a semente de tempos negros obscuros) e não para eras como a nossa em que as atrocidades se tornaram torrentes escorrendo por todas as ruas e tingindo nossas cidades com uma cor ocre e insuportável.

Não espero que o artista repita o feito e espero que nenhum outro idiota tente imitá-lo, o que devia ser dito já foi dito ao custo de uma vida e toda vida é inestimável. Mas quantas vidas podem ser salvas se este horror nos despertar?

Infelizmente eu duvido que a maioria das pessoas esteja realmente horrorizada, pelo menos não o bastante para deixar de usar suas roupas GAP feitas com trabalho escravo infantil, se lambuzar em litros de leite, queijo e carnes feitos às custas da tortura de milhões de irmãos terráqueos ou para buscar um estilo de vida menos consumista e mais centrado no desenvolvimento humano, cultural e artístico.

Por tudo isso não vou votar contra a participação do Guilhermo Vargas (da Costa Rica) na  bienal de  arte centro-americana de 2008 em Honduras.

Links úteis:

  • Artigo posterior no G1: aparentemente na verdade o cão inclusive fugiu da galeria.
  • A Arte Pode Matar: post contanto a verdadeira história (o cão era alimentado e seria adotado depois da exposição)