Eu não devia ter mais de oito anos, mas lembro claramente daquela noite.

Devia ser quase meia-noite quando fui até a sala pedir ao meu pai para ver um desenho na TV. Quando eu tinha 8 anos não existia videocassete, nem SBT, nem internet para consultar a programação, é claro. Não sei como descobri que passaria um desenho de madrugada.

Para falar a verdade era muito estranho que passasse um desenho de madrugada. Hoje há desenhos para adultos, na época nem ficção científica para adultos existia! Até Jornada nas Estrelas só viria a surgir alguns anos depois. Mas o desenho que passou era mesmo diferente.

Meu pai ficou tão incrédulo que me disse rindo meio ironicamente que, se passasse um desenho naquela hora eu poderia ver.

Creio que foi a primeira vez que fui dormir depois das duas da manhã pois o desenho passou e era um longa de mais de duas horas se bem me lembro.

Ainda hoje estava me lembrando que tive a sorte de viver o tempo que gerou duas obras de literatura capazes de transformar seus leitores: Senhor dos Anéis e Fronteiras do Universo. Mas também vivi para ver um desenho da década de 60 capaz de marcar um menino de oito anos até sua idade adulta!

Gostaria de revê-lo, mas nunca consegui descobrir o nome original para poder comprá-lo. Então vou contar sua história aqui na esperança de alguém conhecê-lo!

A Cidade das Pontas

Uma vasta floresta cercava aquela cidade isolada do mundo. Seus cidadãos, todos usando gorros pontudos, formavam uma sociedade pequena, mas coesa e apegada a suas tradições e costumes.

Era um povo tão ordeiro que não havia divergências, ninguém se mostrava transgressor ou colocava em dúvida os velhos costumes. Exceto um.

Esse transgressor tanto fez tentando mostrar suas formas alternativas de ver que foi levado a uma praça onde todos os cidadãos se reuniam para grandes eventos. Era uma sociedade democrática onde todos decidiam juntos o que fazer. Dessa vez eles decidiriam sobre o destino daquele cidadão incômodo.

Durante o julgamento ele tirou o seu gorro e todos notaram horrorizados que sua cabeça não era pontuda sob o gorro, mas redonda como uma cebola. Todos os demais cidadãos tinham lindas e aceitáveis cabeças pontudas como a ogiva de um foguete.

Não havia como manter aquele indivíduo entre eles, então ele foi expulso para a floresta.

Em sua jornada ele encontrou diversas criaturas das quais a única que me lembro era um robô de quatro braços que giravam ao redor do seu corpo.

A cada encontro ele descobria algo novo, mudava e amadurecia até que soube que uma grande ameaça se abateria sobre a cidade que o expulsou, uma represa prestes a se romper se não me engano.

Diante do dilema entre voltar sabendo que seria escorraçado novamente e deixar que os que o humilharam tão impiedosamente morressem ele decide se expor novamente à ira dos outros para alertá-los.

Ao chegar na cidade creio que ele toca um sino ou alarme. Seja como for a cidade se reúne na praça e o encontra sobre o palanque tentando alertá-los.

“Não ouçam nada do que este esquisito tem a dizer!”

“Mandem-no de volta para a floresta!”

“Fora!!! Sem Ponta!!!”

Em meio às vaias alguém lhe arranca o gorro pontudo da cabeça para expô-lo ao ridículo com sua horrenda cabeça redonda, mas ela já não é mais assim, ela tem uma respeitável ponta.

Faz-se silêncio na praça. Os outros cidadãos, lenta e temerosamente, vão tirando seus gorros apenas para descobrir que são eles que não tem mais pontas…

Pelo que me lembro é aqui que o desenho termina.

Não é fantástico que tenham feito algo assim na década de 60? Alguém mais conhece isso?

Atualizando em 30/08/2009

Há alguns meses finalmente descobri o nome do filme e tudo mais! Só esqueci de acrescentar aqui, pois então lá vai!
The Point é de 1971. As vozes são feitas por gente como Ringo Starr e Dustin Hoffman.

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