– Seis horas??
A mulher sai bufando do guichê da companhia aérea para sentar ao lado de uma montanha de malas que mais parece um castelo. Olho para o rapaz atrás do balcão que espera minha pergunta. Bem… ela já foi respondida, só me resta esperar. Aceno com a cabeça agradecendo pela sua atenção e, com um olhar resignado, faço-o entender que também terei que esperar as seis horas.
Vou comprar um livro para ler durante a espera e volto para sentar perto da mulher e do castelo de malas que deve ter quase a minha altura, empilhadas como os tijolos de uma construção medieval. É estranho que ninguém ao redor se pergunte como aquelas malas foram parar ali naquela disposição tão curiosa! Em todo o caso sento-me perto das malas. E ouço uma voz baixa!
Olho a mulher que está com fones no ouvido achando que pode ser ela cantarolando, mas não é, está muito absorta em palavras cruzadas para isso.
– Aha! Bati! – Disse a voz
– Tem certeza que você não está roubando? Já é a terceira vez! – Diz uma segunda voz, mais estridente que a primeira.
– Tá bom, então embaralha você! Tá bom assim?
Em resposta só escuto um resmungo desconfiado. Olho ao redor procurando a origem das vozes e concluo que só podem vir do estranho monte de malas. Não resisto de curiosidade e, fingindo que vou jogar fora algum papel de bala, me aproximo do cinzeiro próximo para escutar melhor.
– Estou precisando diversificar, conhecer mais gente, sabe? – É a voz mais rouca e calma, a que sempre ganha nas cartas.
– Sei… – O dono da voz estridente parece muito concentrado em ganhar o jogo desta vez.
– É verdade! Eu sei que conheço todo tipo de gente, mas são todas muito parecidas. Eu queria encontrar uma… Ah! Você sabe! Uma gatinha mais voluptuosa! Hehe! Só ando com gatinhas mirradinhas ultimamente… Toma, esta vai te fazer comprar este bagaço de cartas!
– Não penso muito nisso, já me basta um bom rato e um balcão livre na ópera.
Devo estar dormindo para presenciar um episódio tão inusitado! Aproveito-me desta certeza para arriscar uma olhada entre as malas. Primeiro vejo uma luz avermelhada, então acho ângulo e vejo claramente uma fogueira e, ao lado dela várias cartas formando trincas e sequências. Um dos jogadores tem um grande chapéu com uma pena no alto e o corpo coberto de pelos, ao seu lado descansa um florete. O outro jogador também tem o corpo coberto de pelos laranja com listras pretas, e uma grande cicatriz acima do olho esquerdo.
– Você é estranho! – Diz o gato de chapéu, o que fala rouco e calmo – Ah! Bati!