… Por gentileza, tratarei bem da sua palavra, mas preciso que alguém me dê uma palavra.

O rapaz caminha entre as poltronas do teatro seguindo um foco de luz que vaga entre os espectadores. Alguns sorriem sem graça, outros permanecem sérios como se possuíssem tivessem faces de cera.

— Muito bem, entendo que ninguém queira me dar uma palavra, afinal elas lhes pertencem, mas me emprestem então! Apenas por um breve momento. Tratarei bem delas e ficaremos todo tempo ali naquele palco sob a luz forte daquele holofote.

— Medo! — Grita alguém na platéia.

— Muito obrigado! Muito obrigado! Tenho então seu medo aqui entre estes dois dedos pois medo é uma palavra pequena, afiada e gelada. Já lhe devolvo seu medo, certo?

— Posso amarrotar um pouco suas palavras, mudar-lhes o sentido e até a cor, mas, garanto, nada que não se resolva com uma lavagem, umas horas ao sol ou uma noite bem dormida com sua palavra entre os braços.

— Novelo de Lã! Porque já está embraraçado mesmo! — Diz outro espectador entre as sombras enquanto contém algumas risadas.

— Muito, muito obrigado amigo! São duas palavras e uma preposião, mas tá valendo e vai muito bem com o medo aqui na outra mão. Mais alguém? Preciso de mais uma ou duas para que elas se encontrem e reproduzam…

— Alfinete!

— Andorra!

— Cachorra!

— Chulé!

A platéia irrompe em uma risada inexplicável enquanto o rapaz suspende uma sobrancelha olhando para o ar à volta como se as palavras o cercassem à moda de mariposas ao redor da luz.

Andorra, Alfinete! Andorra! O navio não nos espera para sempre, mulher! Andorra!
Desfia o novelo da lã dos seus cabelos mais tarde e deixa para tomar um chulé já na viagem porque o medo, Alfinete, este é sempre medo. Intransitivo

Olhando a platéia que ri — e ele não entende por quê — como um lunático, dá os braços à sua mulher imaginária e desaparece entre as sombras do palco para uma viagem sem volta aos bastidores pois o próximo já vem entrando pelo outro lado.

— Josefina!!!! Josefina!!!