Você atravessa a penumbra das ruas de Botafogo em direção a sua casa, seu edifício de tantos anos e tantas memórias… Entra pela portaria mal iluminada… aconchegante. Em sua cadeira o porteiro o cumprimenta. Você se olha por um segundo no espelho enquanto o elevador desce. Abre a porta…
Lá dento; dura, lívida, de pé e apoiada por dois agentes funerários! O corpo inerte daquela velhinha do outro andar! Seus olhos a percorrem de alto a baixo! Tentando encontrar meios de negar a realidade diante deles: o corpo enrijecido de uma ansiã morta o convida de dentro do elevador a lhe ceder espaço para sair e seguir seu caminho para o necrotério!
É a preguiça… Ela e a incrível capacidade humana de adquirir costume! Nos acostumamos a gente morando na rua, a violência, autoconsideração e tantas outras coisas! Por elas (a preguiça e a capacidade de se acostumar) os agentes funerários decidiram descer a falecida pelo elevador social como se nada houvesse de anormal em uma senhora falecida decidir partir de casa de forma digna!