Não existem. Nada é ordinário ou sem graça. É o observador que perde o senso de êxtase.
Vim caminhando com um amigo por Botafogo, falando banalidades sérias. Essas coisas de que tem que reclamar da vida sim! Reclamar e fazer algo para ir conquistando sempre um pouco mais.
E por falar nisso lembro de hoje de manhã. Um cartaz político dizia “não reclame, vote!”. Eu hein? Reclamo sim!
O assunto foi mudando, falei sobre um livro de gestão do conhecimento que a gente escreveu e não publicou. Já estávamos descendo as escadas do Metrê de Botafogo quando ele sugeriu publicar lá fora, em outros países de língua portuguesa. Boa ideia.
Chegou o trem dele e fiquei lá na estação à espera do meu. Com sede. Nossa! Quanta sede!
Essa máquina aí me seduzia com a, nada saudável, promessa de líquido gelado…
Aliás, que máquina decadente, né? Faz tempo que estão assim. As máquinas de Coca mais parecem geladeiras de tubaína.
Ao menos era instigante a estação que se estendia amarelada sob a luz artificial e povoada por uns poucos espectros que se dissipavam em seu torpor individual.
Comprei – e paguei caro – uma Coca. Veio quase quente. Nem bebi. Guardei. Agora está lá em cima no congelador. Mais um pouco acho que congela.
Demorado aquele trem, sabe? A estação ia enchendo e eu ia pensando (sempre vou pensando) nos pensamentos escondidos atrás dos rostos duros que lentamente enchiam a plataforma.
Tinha – lá no vagão que peguei – um rosto que não era duro. O rosto de uma moça com seus vinte e quase trinta anos. Era um rosto que sorria, mas sorria o tempo todo! Sem relaxar por um segundo sequer.
Você consegue imaginar um desses sorrisos apertados que enfeitam o rosto com um vasto traço de lábios?
E um par de olhos que brilha e forma ruguinhas? Era um sorriso tão persistente que incomodava. Parecia que achava tudo ao redor muito hilário, ridículo mesmo. Acho que a moça estava com problemas, algum tipo de anestesia esquisita, sei lá. Só sei que ela volta e meia mexia na boca como se estivesse tentando medir a extensão do sorriso. Bem, era esquisito, mas pelo menos era um rosto diferente na multidão de carrancas fechadas.