Eles doem um pouco. Tem um cantinho da costura do sapato que esfrega no dedinho mindinho… Arrg! Dói para danar depois de andar a Voluntários quase toda, mas é um sapato lindo! Vermelho, salto alto e com uma faixa bege do lado.

A parte difícil é manter a pose depois de uma caminhada de quase meia hora nas calçadas estreitas. Bem, ao menos os olhares e gracinhas vulgares que dizem para ela lhe dão a impressão de que continua gostosa.

Com certeza quem a olha pensa em uma mulher numa boa. Bem empregada, com um namorado bonito, sarado e com grana. Bom, filhinho do papai, mas afinal o que todo mundo quer é uma boa vida com algum papai para dar grana enquanto a gente só curte com a gostosa que vai andando ali toda linda em contraste com os prédios velhos e pessoas nem de longe tão bem alinhadas.

Atrás dos belos olhos verdes no entanto há uma cabecinha a mil.

Porra, já estou com 25 anos e nada de um emprego decente. Foi uma merda! Eu sei que essa entrevista foi uma merda! Eu não devia ter ido com esta roupa. Sensual demais caralho… Vão achar que sou uma patricinha mimada que não aguenta pressão! Pressão… Fala sério, minha vida toda é uma pressão. Será que o viado do Carlos tava dando em cima da Rafa? Filho da puta… É bem capaz… Toda hora ele me enrola… Diz que foi fofoca, inveja, intriga, paranoia minha… Mas pombas! Eu nunca fui paranoica antes dele, vou ser agora? Cara… Porque não me ajeito na vida? Tenho que terminar a facul, tirar o peso de cima dos meus pais… Cacete… Vivo brigando com eles porque não me dão grana, nem um carro eu tenho, mas, Mara, coloca a mão na consciência! TEU PAI NãO TEM MAIS TANTA GRANA! Ele só não quer dizer e eu não quero acreditar que um dia vou ter que me virar por conta própria ou virar esposinha de alguém rico.

E lá vai ela envolta em uma atmosfera de olhares de desejo e de inveja.

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