– Ah! Tem que se prostituir um pouco sim, sabe? Cara sem grana a gente fica sendo só aquele artista amargo, triste, que reclama e não faz nada.
É, todo mundo hoje reclama, mas pouco ou nada faz.
Sentada no ressalto entre a sala e a varanda, despojada das formalidades que não valem entre amigos que compartilham a alma, Anam Kara como diriam os celtas, ela conta sobre as transformações da sua vida.
Pouco mais de 25 anos e tantas transformações. Hoje parece cedo, mas houve tempos em que grandes poetas morriam por ai mesmo, ou se matavam. Que o diga Mello Mário de Sá-Carneiro.
– O que é foda é a gente ir numa peça horrível, uma merda mesmo, sabe? E cara! Trinta paus, pô! E lotado! O maior besteirol e o teatro lotado!
Pois é, a sociedade do espetáculo onde o que vale é o esquecimento e não a qualidade do que vemos, não se pensa mais, o negócio é se entregar ao remanso das ondas que apagam as pegadas na areia.
– Cara, a gente quer fazer uma coisa diferente, algo nosso, entende…
Lá fora, em frente à portaria do prédio – ela está no último andar de um edifício – um bando de jovens passa sua tarde como todas as outras: fumando maconha, ouvindo iPods e falando ao celular. Tudo que eles querem é ser iguais. Não tem espaço para ser diferente.
Será que não?