Já é de noite, hora de olhar para a lua praticamente cheia lá no céu e conversar, mas hoje nossa cadela carente veio depositar seus protestos em nossa varanda e lá fui eu esfregar o chão sob o olhar curioso da mãe Lua.
As mãos trabalham e a mente começa a brincar de ligar pontos.
Fico lá pensando na raiva com que muita gente trata seus cães, na violência do PCC, nas violências contra quem tem jeito de ser do PCC e como tudo poderia se resolver com a capacidade de se colocar no lugar do outro.
E me sinto observado…
– Você gostaria que o mundo fosse um lugar de paz, né?
A voz fina e sibilante vem do parapeito da varanda. O vento frio faz as grandes abas do seu chapéu oscilarem como se tivessem vida. Ele tem bigodes longos, pelos mesclados azul-cobalto e outra cor indefinível. O velho companheiro de alucinações, o Gato de Botas, sempre aparece assim, de surpresa.
Olho para ele sem responder.
– Você afinal é cristão, Roney?
– Você sabe que não Gato. Já fui, é claro, quase todo mundo já foi.
– Então é por isso que você ainda sonha com o paraíso e rejeita o mundo real?
Odeio quando ele me faz parecer infantil e sonhador. Do tipo de sonhador que só tem olhos para a fantasia.
– Tá bom, é incoerente da minha parte, mas a maioria das pessoas segue o cristianismo, e agora, Gato?
– Ué!? E eles não foram expulsos do paraíso?