– Foi um sonho…
Ela brinca com o fio do telefone enrolado no dedão do pé enquanto espia os cartazes de bandas de rock colados na parede e uma foto autografada por um rapper.
Deitada em sua cama a amiga prepara um cigarro de maconha tão compenetrada que morde levemente a língua.
– Foi um sonho que eu tive, tá escutando?
– Oi? Tá falando comigo? – A amiga derruba um bocado de erva na cama quando se vira – Pensei que tava no telefone falando com alguém.
– Não, tô esperando a atendente vir dizer que “vai estar resolvendo meu problema e vai estar informando” qualquer porcaria. Eu tive um sonho Vi, muito estranho…
A noite já caiu faz algum tempo, apenas a luz do monitor do computador ilumina o quarto criando sombras e silhuetas dançantes. As duas amigas, com a pele azulada pela luz, parecem não estar realmente ali, como se fossem elas mesmas sonhos de alguém.
O silêncio do apartamento de fundos as inspira a falar suave e lentamente. O tempo delas é diferente do tempo do mundo. É mais lento, mas avança mais rápido como denunciam os olhos que brilham intensamente.
– Era assim… Tinha um castelo enorme, acho que num país árabe e eu me perdia nos jardins que eram um verdadeiro labirinto. Lá pelas tantas eu já não sabia de onde tinha vindo e nem para onde ia, na verdade era como minha casa fosse ali e nunca tivesse ido a outro lugar. Puxa… E eu era muito, muito feliz entre os arbustos altos. Estranho, né?
– Bem, sonho é estranho mesmo, né Fer? Pelo menos foi maneiro. Mas tinha algum cara? – Ela come algumas sílabas pois finalmente está lambendo a seda do baseado.
– Haha! Tinha! Tinha sim! Era a parte mais legal do sonho! Como fui esquecer? A gente fazia umas festas, ficava dançando descalços na grama molhada e fresca! Era um monte de gente, acho que você tava lá! E a gente se abraçava! Puxa! Parecia com aquela vez que a gente foi para Ibitipoca!