Uma balbúrdia circula pelo bar no centro histórico onde nos séculos passados caminhavam poetas boêmios que morriam de tuberculose precocemente, mas achavam tempo para povoar as linhas da literatura com vozes veludosas, veludosas vozes de um passado mais distante para a memória do que para os anos.
Na mesa branca se espalham copos, cestinha com pães, bandejinha com aperitivos acebolados e meia dúzia de máquinas digitais.
Cinco amigos ao redor da mesa desfiam memórias, histórias, opiniões, tiram fotos… Risadas pontuam as frases e dão o ponto final continuativo das histórias que parecem sempre terminar com reticências.
As mesas ao redor são imagens desfocadas. Turistas que se alojam nos albergues e hotéis mais baratos ou que pesquisaram e foram capazes de encontrar aquela região de tesouros escondidos da velha cidade turística. Outros ali saíram dos seus trabalhos e buscaram o famoso chopp gelado. Uns poucos caíram ali por mero acaso.
Do lado de fora as ruas já escuras e vazias do movimento febril do último dia útil de 2008.
A julgar pela chuva de papéis de trabalho catarsicamente picotados e defenestrados muita gente considera os dias não úteis mais úteis, ou pelo menos mais agradáveis, que os dias ditos úteis.
Na praça, assistidos pelos olhos silenciosos das janelas do altivo mosteiro que permanece invisível até que de lá escapem as notas graves do canto sacro, homens de laranja operam vassouras e máquinas de varrer para remover pilhas de papel picado.
Não há pessoas na cidade. Estão todas mais além…
As escadas rolantes do metrô desembocam como rios em vários pontos da Princesinha do Mar já alagando suas ruas, calçadas e areias com os primeiros milhares que logo serão mais de um milhão de pequenas pessoas que se espremem para ver o fim de um ano ritualisticamente queimado pelos fogos que explodem em cores e formas no céu escuro da última noite do ano.