Quase um mês atrás um grande amigo me pediu que abrigasse sua amiga italiana que viria ao Rio para estudar o Teatro do Oprimido. Ela chegou na quinta-feira passada.

É uma moça jovem, com todo jeito de carioca, destas pessoas com quem fazemos amizade instantaneamente. Nos seus 22 anos já conseguiu tempo para falar um punhado de línguas, passar dois meses na Índia (onde aprendeu mais uma língua), três anos estudando antropologia em Londres, fazer balé, teatro e agora está aqui, aprendendo cada vez mais.

É… Tem gente que realmente fixa um objetivo e sabe buscá-lo.

Mas tive vergonha!

O pai dela, afinal é filha e tem apenas 22 anos! está no país para ter certeza da segurança da sua pequena. A propósito, vendo o pai entendemos a filha! Bom sujeito! Bom sujeito mesmo! E ele ficou preocupado ao ver a Lapa e escutar os aviso do segurança do Centro do Teatro do Oprimido.

Não gostamos de admitir e nos acostumamos tanto com o nosso meio que já não o vemos mais, a não ser através de uma grossa nuvem de indiferença. No entanto, ao me colocar no lugar daquele pai também tive medo! Tive medo e me envergonhei que não possamos receber os visitantes garantindo-lhes paz!

Sim, é verdade que a nossa injustiça social é o que atrai vários deles. É verdade que as nossas veias abertas podem ser a nossa salvação: onde a doença aflora é também onde ela será mais compreendida e melhor combatida. Mas tive vergonha!

Eles não disseram nada, mas as fileiras de homens sem trabalho que esperavam comida eram uma chaga que não precisava de comentários!

Enquanto tenho vergonha escuto os ecos dos nossos discursos demagógicos que engendram justificativas para amenizar a nossa responsabilidade e transferí-la para eles, os que moram nas ruas, que comem nas ruas, que perderam as esperanças.

Vou carregando minha vergonha, nossa vergonha, enquanto as Marias do Brasil, empregadas domésticas e de tantos dons, cantam e dançam sua história entre as paredes rústicas das instalações do Teatro do Oprimido!