Um silêncio turbulento preenche as ruas. É carnaval, mas não há mais o batuque dos blocos ou a algazarra dos foliões. A madrugada dá seus primeiros passos em direção à próxima alvorada e os ávidos seguidores de Baco encontram outras regiões para suas festividades.

O ruído turbulento chega apenas pelos ecos dos excessos dos três dias que os lixeiros não conseguem apagar.

As vozes ao redor, o ruído dos carros e do vento não são diferentes dos outros dias do ano, mas o cheiro ácido da urina despejada no chão, as cinzas molhadas que sobram de algum churrasco feito em plena avenida e vastos montes de lixo, em sua maioria restos de embalagens levadas por vendedores ambulantes, mantém em suspenso no ar a vibração que ainda há pouco tomava as ruas.

É uma experiência abjeta. Não são as memórias da alegria que vemos e escutamos. São poucos os traços de serpentina ou confete. Da festa, boa ou ruim, não sei dizer, ficou apenas a sujeira.

A um observador tardio fica a impressão de que nada houve ali além do esfregar de corpos suados vazios de sentimentos, repletos de emoção superficial. Isso e a falta de cuidado com o mundo à volta.

Já um observador atento, ainda que tardio, perceberia que a tristeza maior não é a libidinagem e o hedonismo, mas os despautérios de hordas de vendedores ambulantes que não se esforçaram ou não tiveram recursos (materiais ou morais) para demonstrar respeito pelos foliões-clientes e pela cidade que os acolhe.

Mas segue a festa e a transgressão das normas são o precioso instrumento que nos protege das tiranias. Que o carnaval siga eterno!