Começo reforçando: contém spoiler! Isso quer dizer que vou falar de coisas que acontecem no filme.

Raramente faço isso, mas nesse caso terei que citar algumas surpresas (quase todas) do filme para explicar porque achei que é uma das histórias mais mal escritas que vi no cinema (tirando, claro, os filmes trash). Creio que nem Independence Day, com os alienígenas que rodavam Java, conseguiu a proeza.

Só que vou começar discordando de mim. As pessoas andam confundindo as opiniões com as pessoas que as defendem. Opinião é para ser desrespeitada, gente! Só assim a gente acha os furos nelas! Isso não tem nada a ver com respeitar ou deixar de respeitar as pessoas… Aliás, tenho que escrever um post sobre respeito e opinião…

Bem, vamos lá…

Por que Prometheus é bom? Muito bom?

Quando não gostei do filme alguém me mandou um artigo muito bom que se perdeu na timeline do Facebook e agora não encontro mais. Quase tudo que direi agora veio desse artigo ou foi inspirado por ele.

Prometheus vem mudar o caráter não só da franquia Alien, que eram basicamente histórias sobre amizade e responsabilidade com um pano de fundo de terror, mas também dos filmes de ficção científica.

A história central não recai sobre a amizade, é uma equipe individualista e sem grandes laços emotivos exceto pelo casal protagonista (que, juro, no começo achei que era coadjuvante), mas ele também não é o centro da história.

Prometheus é sobre encontrar um sentido para a vida, não para a vida em geral (vou falar disso já já), mas sobre o que cada indivíduo fará para dar sentido à própria vida.

No cenário de fundo temos o retorno à ficção científica metafísica ou que pelo menos se preocupa com as velhas questões existenciais.

Isso deve bastar para fazer de Prometheus um filme, no mínimo, muito útil.

Mesmo sendo humanista e não simpatizando com o teor religioso das buscas e respostas aos questionamentos existenciais do filme creio que somente o fato do cinema voltar a lançar essas questões para o grande público (eu sei que sempre tem filmes que cumprem esse papel, mas são vistos por meia dúzia de pessoas) já justifica festejarmos essa produção.

Além disso há muitos outros detalhes interessantes e não estou falando de alguns diálogos como o que o androide tem com um humano sobre o relacionamento criador/criatura, mas sim do perfil da protagonista que é muito mais humana, muito mais mulher do que outras heroínas tem sido.

No processo de empoderamento (estou usando essa palavra para provocar alguns amigos que se irritam com ela… E com razão, ela é linguisticamente feia) das mulheres nós vimos surgirem mocinhas que, apesar de fracas conseguiam vencer no final, muitas vezes por serem fracas. Depois as vimos, paulatinamente, se igualarem aos homens até chegarmos à sensacional Starbuck de Batlestar Galactica.

Em Prometheus temos uma mulher normal como você que está lendo esse post, como a moça no caixa do banco.

Apesar da protagonista mostrar algumas capacidades físicas fora do normal eu diria que isso foi acidente de percurso ou licença poética da ficção: ela não era fisicamente especial, não era mais forte emocionalmente, mentalmente ou socialmente (ando com essas quatro resiliências na cabeça por conta de uma fala da Jane McGonigal) superior a nenhuma mulher.

Elizabeth Shaw faz tudo que faz não por ser uma heroína, mas simplesmente porque teve que fazer para continuar em frente. Sua força é seu desejo de viver, sua fé e sua curiosidade.

A propósito a curiosidade talvez não esteja ai conscientemente, mas completa o triângulo capaz de evitar que a fé se torne cega.

Talvez agora você esteja se perguntando “Se o filme tem tudo isso então como esse idiota diz que não gostou?”

Cara, eu não gostei porque tenho a nítida impressão que essas coisas todas estão no filme “por acaso”. Digo isso porque acho que a história foi escrita de forma tão descuidada que não acredito que eles tenham pensado: vamos fazer essas críticas e questionamentos existenciais?

O espírito do nosso tempo se infiltra em tudo que falamos e escrevemos. O que desconfio que aconteceu foi isso. Eles colocaram no papel o que ia aparecendo e o inconsciente deles fez o resto do trabalho.

Então por que acho que a história é tão furada assim?

Por que Prometheus é muito ruim? (Agora tem spoiler)

Preste atenção. Não sou daqueles chatos que reclama do barulho do laser, da forma como as naves se movem no espaço como se houvesse uma atmosfera ao redor delas, mas tem coisas que precisam ser coerentes.

Essa sessão será apenas uma lista de spoilers de coisas que acho tão incoerentes em Prometheus que passei a não acreditar que tenha havido qualquer cuidado para criar a história.

Vai em ordem cronológica.

  1. As projeções de engenheiros fugindo mostra que foram para a sala cheia de armas biológicas (o que já não faz sentido) e não há nenhum sinal deles ou de confusão quando os exploradores entram na sala.
  2. Assim que descobrem que há atmosfera respirável na nave (que eles ainda acham que é uma caverna) o cientista chefe imediatamente retira o capacete e todos o imitam! Isso é desnecessariamente inverossímil!
  3. O geólogo que fez o mapeamento dos túneis se perde lá dentro… E na verdade só tem um corredor com uma bifurcação para a saída.
  4. Logo depois de avisar que há sinais intermitentes de vida na estrutura alienígena onde o geólogo e o biólogo estão perdidos, o piloto da nave vai dar uma transadinha com a Charlize… Ok, isso eu talvez fizesse também, afinal quem quer cuidar de um cara que se perde em uma estrutura tão simples?
  5. O biólogo, ao encontrar um tipo de serpente naja alienígena, resolve brincar com a criatura como se fosse um coelhinho.
  6. Descobre-se que os engenheiros passaram dezenas de milhares de anos deixando mapas em cavernas de humanos primitivos que indicavam a posição do planeta paiol. Isso não faz sentido.

Tá bom, né?

Coisas que eu aceitaria:

  1. Em vez de tirar uma amostra de sangue ou do próprio tecido o engenheiro se sacrifica para semear a Terra com vida. Eu aceitaria isso porque tem ai uma clara referência ao sacrifício de “Deus” para dar a vida.
  2. Os engenheiros não terem mudado nada em 3,8 bilhões de anos (foi quando surgiu vida na Terra).
  3. O piloto da nave com o óleo negro de Alien ter ficado 2000 anos em animação suspensa em vez de ir cumprir a missão dele
  4. A protagonista ficar grávida, mas não contaminada, ao transar com o cara que “contraiu” alien ao beber uma gota do óleo negro (sem saber, claro)
  5. Ninguém se incomodar em deter a protagonista enquanto ela corre pela nave, invade os aposentos da poderosa financiadora da expedição e usa os aparelhos caríssimos. Aliás, nem senha tem para entrar nos tais aposentos.
  6. O engenheiro, em vez de ir cumprir sua missão ou destruir as sobreviventes de cima, vai de mãos nuas e descalço matar a pessoa que, de qq forma morreria em breve.
  7. O morro em cima da nave dos engenheiros sumir na hora que ela vai levantar vôo.
  8. Uma mulher normal sair correndo e fazendo parkour depois de uma cesariana.
  9. Dizer que o DNA dos engenheiros é igual ao humano em vez de dizer “compatível com todo DNA terrestre”.

Com tantos furos não consigo acreditar que houve realmente cuidado na criação da história.

Conclusão

Apesar de tudo isso e de só ter achado razões para gostar do filme dias depois de assisti-lo eu saí feliz da sessão.

O filme é bem feito, os cenários são muito bons, os efeitos também (eu dispensaria o 3D, mas isso é gosto pessoal), os personagens são carismáticos e a ação diverte.

Se você for capaz de abstrair (ou nem notar) os furos da história ele é um excelente filme.